A pimenta jiquitáia e o freguês

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Eu quero insistir no tema da pimenta dos índios Baniwa porque é mais um exemplo na gastronomia de utilização do conhecimento tradicional que não vai acompanhar o prato até na frente do freguês e isto é uma pena. A pimenta jiquitáia vai chegar na mesa de quem pode pagar mais de 100 contos por uma refeição e vem acompanhada de um tempero que o brasileiro adora, índio. Daí para frente o chefe pode adicionar a pitada de exotismo que quiser para a pimenta arder mais ou menos que o prato vai fazer sucesso, mesmo sem nunca ter visto um Baniwa na frente e, muito menos sem saber onde fica o alto Rio Negro, que esta lá no alto do mapa do Brasil, à esquerda. A região é conhecida como Cabeça do Cachorro e é Terra Indígena demarcada. Para muita gente o Rio Içana, onde vive os Baniwa é o fim do mundo, muito mais agradável e rápido ir para a Espanha. Daqui até São Gabriel da Cachoeira são 7 horas de vôo e mais umas 10 horas de voadeira para chegar até na boca do rio Içana. Da boca para cima, até o focinho do cachorro que é o fim do Brasil, na divisa com a Colômbia, a viagem pode durar uma semana em um barco com um bom motor de popa. O rio é deslumbrante e a cada tanto comunidades de Baniwa aparecem entre cachoeiras de deixar o Avatar no chinelo. Este é o meu desgosto. Ver esta pimenta chegar sozinha na mesa, desacompanhada do seu melhor, da cultura de sua gente, da história, do pedaço de um chão maravilhoso que nós conhecemos pouco e ainda não aprendemos a valorizar. Pior, não se fala em contrapartida, questão de princípio, de conduta. Para os chefes os Baniwa são simples “fornecedores ou catadores” e nada mais.

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