…e agora a camiseta

banana

O passo seguinte depois do primeiro tiro é vestir uma camiseta.

Estavamos indo para a aldeira Kranhacãrore quando  um índio pulou na picada oferecendo uma banana. Na outra mão segurava um punhado de flechas, o arco e uma pequena matula, um enbrulhado de folhas de banana amarrado com cipó. Tinha um pedaço de carne de caça assada e  batata doce cozida.

Era um jovem caçador que a partir do momento que vestiu aquela camiseta branca perdeu a camuflagem natural, não tinha mais a capacidade de mimetização para se aproximar da caça.

Virou um espantador.

4 Comentários

Leticia Freire   em 20 março, 2009

Em 2005, tive a oportunidade de viajar para Honduras. Foi minha primeira viagem (e primeiro projeto pessoal) como fotojornalista.
Meu objetivo era reportar a importância do comércio justo para as cooperativas de pequenos produtores de café. O que me mobilizou a imergir nesse assunto foi o lado amargo da safra. Foi o início da minha investigação sobre o impacto do comércio justo para milhões de pessoas ao redor do mundo.
No caso do café, me parecia surreal imaginar que uma commodity de tanto peso para economias frágeis fosse negociada na Bolsa de Valores sem a fixação de um preço mínimo que garantisse, pelo menos, a subsistência dos produtores. Como não têm volume no giro de capital, os agricultores sofrem restrições de acesso a crédito, o que os torna ainda mais vulneráveis frente à oscilação dos preços. O resultado desta equação é o aumento da pobreza, miséria, violência e degradação ambiental.
Estar ali, isolada, vivendo com os agricultores e suas famílias, na fronteira com a Guatemala, me deu real noção da frágil teia da vida. Sai de Honduras levando 50 rolos de filmes e uma camiseta usada, dada pela dona da casa que me hospedou. “Foi um prazerâ€, ela disse. “Foi uma aulaâ€, respondi.
Ainda não tive oportunidade de aprender com os índios como eu aprendi com os cafeicultores hondurenhos. Quer dizer, ainda não tive oportunidade de conviver com eles. Mas desde muito cedo entendi que a fotografia poderia provocar uma reflexão boa, ainda que numa escala triste. Talvez seja dessa sutil tristeza que Vinícius de Moraes fala quando diz “a vida é feita de encontros, mesmo nos desencontros da vidaâ€.
Olhar a histórias dessas imagens chateia um pouco o coração. Para onde vamos, Pedro? Até quando?
Ainda assim, gostaria de dizer que suas imagens e suas histórias fazem pensar (e o ser humano precisa refletir mais).
Pedro, “foi uma aula”, obrigada.
Um abraço,
Leticia Freire

Bruna Prado   em 20 março, 2009

Nós, digo nós no sentido de colonizadores… não aprendemos com eles respeitar nossa terra e viver em comunhão com ela, por incapacidade. Já eles aprenderam conosco o que não deveriamos ensinar. O resultado está ai… representado por sua foto e texto.

Grande abraço,

Bruna Prado.

Pedro Martinelli   em 21 março, 2009

Bruna, depois de todos estes anos ainda não tenho opinião formada sobre como
devemos proceder, principalmente com os que ainda estão isolados. É difícil. Estaremos
sempre, de uma forma ou de outra decidindo por eles. Se devemos ou não fazer o contato.
No fundo eu acho que quem esta tentando nos contatar são eles que se esforçam para
nos convencer a não trata-los como gente do andar de baixo como fazemos com outras tantas
minorias.

Pedro Martinelli   em 21 março, 2009

Leticia, eu não sei mas toda vez que eu passo nas margens dos rios Tietê e Pinheiros
e vejo aquela montanha de lixo boiando eu acho que não vamos para lugar nenhum.
Se não conseguimos resolver o esgôto a céu aberto que cruza a maior cidade do país,
que tem em suas margens a Usp, que construiu uma raia olímpica com água bombeada
daquele rio infecto, acreditar em que? Ainda não conseguimos cuidar do nosso quintal.

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